Autor: Marcelo Costa de Araujo
Vice-Presidente do CTSMART

O setor elétrico sempre esteve fortemente focado em grandes ativos físicos. A expertise necessária para operar e manter equipamentos como transformadores de potência, disjuntores, transformadores de corrente e de potencial, reatores, compensadores de reativos, entre outros, é dominada pelos profissionais do setor há décadas.

A revolução trazida pelos avanços em equipamentos eletrônicos e sistemas de informação traz novas oportunidades e desafios. Grandezas como temperatura, nível de óleo, pressão de gás, correntes de curto circuito, oscilações em frequência e níveis de tensão podem ser coletados por dispositivos eletrônicos inteligentes (IEDs em inglês) acoplados aos equipamentos de pátio de subestações e linhas de transmissão. Se, no passado, era necessário adquirir os sensores separadamente dos ativos de alta tensão, hoje é possível adquirir equipamentos prontos para serem conectados a uma rede, onde os componentes eletrônicos e de comunicação são parte integrante dos equipamentos, o que leva a uma mudança na forma que os processos de operação e manutenção vêm sendo executados.

https://www.eprmagazine.com/sspecial-report/driving-td-sector-the-iot-way-2/ Acesso em 22/03/2019

O grande volume de dados gerados torna praticamente inviável uma análise aprofundada por seres humanos. As ferramentas de data analytics permitem a detecção de padrões de degradação no desempenho de equipamentos com maior velocidade do que a que seria possível sem esse recurso. Possibilitam, ainda, por meio de técnicas de machine learning, prever o impacto na saúde dos ativos de ações executadas pelas equipes com base em registros históricos. Esse monitoramento preditivo das grandezas permite que ações sejam tomadas pelas equipes de campo antes que a degradação incorra em uma falha ou defeito, o que afetaria o resultado das empresas e poderiam prejudicar o cotidiano da população que depende da energia gerada, transmitida ou distribuída pelas companhias elétricas.

Porém, as ações resultantes dos processos decisórios serão tão boas quanto os dados que as subsidiam. Isto é, requisitos como a acurácia, completude, pontualidade e consistência dos dados precisam ser assegurados para um bom resultado empresarial. Se esse objetivo não for alcançado, mesmo os melhores sistemas de coleta e análise de dados podem não trazer os benefícios esperados.

Como fazer isso?

Antes de tudo, é necessário definir que tipos de dados serão coletados e qual o nível de detalhamento que cada stakeholder necessita. Ao mesmo tempo, é necessária a compreensão de como esses dados se inter-relacionam. Qual é o impacto econômico e na imagem da empresa de um desligamento de uma linha de transmissão? Qual é a melhor solução técnico-econômica para ativos em final de vida útil? Qual é o impacto regulatório dessa decisão? Que dados me permitem fazer esse tipo de avaliação?

Como se pode perceber, uma visão holística é necessária, quebrando barreiras entre os departamentos de uma empresa, cada qual detentor de uma parte da informação. É aí que entra a gestão de ativos físicos que, se bem executada, viabiliza a integração dessas diferentes fontes de informações.

A gestão de dados é parte integrante da gestão de ativos. Ela é focada em 3 eixos principais:

• Pessoas
• Processos
• Sistemas

Qual a relação entre eles? Quais as consequências de uma gestão de dados ineficiente? Imagine que uma companhia investiu em uma nova solução informatizada para auxiliá-la em suas decisões de novos investimentos. Se o processo de coleta e inserção de dados não estiver desenhado, com os papéis dos profissionais bem definidos e sem um processo de auditoria dos dados coletados, as informações que alimentam o sistema podem estar incorretas, incompletas ou até mesmo inexistentes, deixando de refletir a realidade encontrada no campo. Isso gera atrasos na tomada de decisão, pois exigirá retrabalhos para consistir os dados. A mesma informação pode estar registrada em fontes distintas e inconsistentes entre si, o que gera maiores dificuldades. Outros exemplos de problemas: requisitos regulatórios podem deixar de ser atendidos devido ao atraso no levantamento de dados, gestão ineficiente do ciclo de vida dos equipamentos e incidentes de segurança cibernética provocados por desconhecimento dos ativos digitais operativos das concessionárias e suas vulnerabilidades.

As soluções para esses problemas também estão nos 3 eixos citados anteriormente. Investimentos em novos dispositivos de monitoramento, qualificação das equipes para se adaptarem às novas tecnologias incorporadas aos ativos de alta tensão, registro de dados consistentes na etapa de instalação e comissionamento são alguns exemplos.

Concluindo, a digitalização do setor elétrico é um caminho sem volta. Ao mesmo tempo que soluções de automação, TI e telecomunicações podem transferir tarefas antes executadas por indivíduos para dispositivos inteligentes, o desempenho dos sistemas de computação permanece dependendo da gestão de processos e pessoas. Mesmo em um ambiente digital,
as ações humanas continuam tendo impacto relevante. É preciso preparar as próximas gerações de profissionais para compreenderem as vantagens e limitações de novas tecnologias, para que prossigam usando sua criatividade para encontrar novas soluções em um ambiente em constante evolução.

https://www.cnet.com/pictures/inside-a-power-grid-control-room-photos/ Acesso em 22/03/2019