Autor: Renato Barros
CSO Bellatrix/Consultor Sebrae associado CTSMART

Em minha experiência na Europa concluindo um ciclo de estudos em julho de 2018, fui surpreendido por um cenário profissional na minha área de atuação – Consultoria Empresarial e Gestão – qual seja, que existem “Dois Portugais” (tive essa certeza com o passar dos meses). Um deles, o da ciranda financeira ostensiva, reconhecida e cobiçada mundialmente, Grande Lisboa e Grande Porto, e o outro, muito carente de recursos humanos qualificados e capacitados, demandando muitas ações profissionais de qualificações, capacitações e execuções. Este segundo acredito que se deva às políticas governamentais e tributárias de Portugal; a aspectos sociais tais como ter o menor ordenado europeu (nome dado ao nosso salário mínimo), fazendo com que os jovens formados, capacitados e qualificados busquem mercados externos para obter remunerações e benefícios mais atrativos, interessantes e promissores.

Toda esta narrativa introdutória visa a responder as diversas indagações que me fazem em palestras, congressos, fóruns, mesas, canais digitais, redes sociais e bate papos informais, etc. acerca de como é o mercado profissional em Portugal. Vale a pena ir para lá? Como são os métodos e técnicas disponíveis? Dentre centenas de dúvidas.

Ocorre que, neste cenário, no “Segundo Portugal”, que são as cidades (chamadas em Portugal de concelhos) fora da Grande Lisboa e Grande Porto, há carências em diferentes aspectos, ações, técnicas e métodos ligados a gestão de forma geral. Não me refiro aqui a práticas modernas e/ou inovadoras, e sim a conceitos, condutas e ferramentas básicas. Na execução de minha atividade como empregado de uma empresa portuguesa, ocupando a função de Consultor Sênior, atuei nessas cidades, e pude de fato constatar a gigantesca oportunidade para novos negócios com boas práticas de gestão brasileira.

Em certa ocasião, fui demandado para fazer um diagnóstico organizacional numa cidade a cerca de 70 km do Grande Porto, objetivando elaborar um futuro cronograma de trabalho na prestação de serviços em consultoria empresarial, porém tal intento restou por perder seu real sentido. Explico: em todo território português é praxe que os contadores, lá chamados de “contabilistas”, carreguem, em suas razões sociais e atividades econômicas, o nome que distorce o contexto, tal como: José Contabilista e Consultadoria Empresarial. Como o governo português oferece a possibilidade de recolhimento tributário trimestral, semestral e anual (não faço menção a declaração de imposto de renda anual, conforme tratada aqui no Brasil, e sim aos pagamentos, analogamente equivalentes aos da tributação brasileira, das alíquotas de impostos estaduais e municipais que, em território brasileiro, são pagos mensalmente, no fechamento de balancetes, DREs, etc), a maioria dos empresários do “Segundo Portugal” optam pelo recolhimento anual, o que é adotado pelos contabilistas em sua atuação. Desta forma, os números considerados são do exercício anterior, o que prejudica a análise dos dados da empresa. Assim, seguindo a máxima de que sem métrica não há gestão, o resultado é desastroso, o que se pode esperar de um ambiente mercadológico com este perfil.

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Voltando ao Jobs, a demanda do diagnóstico organizacional acima citado, o empresário me encaminhou para tratar com uma recepcionista, totalmente despreparada, pessoa que seria responsável por responder todas as questões que iriam diagnosticar como
estavam os processos de sua organização. Diga-se de passagem, organização esta que faturava alto, não era uma pequena empresa, nem tão pouco um microempresário, e este mesmo empresário não sabia dizer NADA sobre planejamento, fluxo de caixa, indicadores, margens, lucro líquido, entre outros conceitos e práticas de uma boa gestão.

Destaca-se ainda que alguns poucos contabilistas, pois não estamos falando de regras, quando apresentam o balancete anual, tecem considerações sobre a gestão da empresa, mas repito, são minorias, fazendo com que haja uma lacuna enorme para o desenvolvimento das atividades de Consultoria Empresarial em seu sentido literal, diferente do que se compreende lá como Consultadoria Empresarial, pois em Portugal o conceito é totalmente distorcido.

Para se ter uma ideia, na empresa em que era Consultor Sênior, fizemos uma espécie de seminário, seguido de um workshop prático (oficina) para transmitir as ferramentas e cases em que atuávamos aqui no Brasil, e as empresárias proprietárias fizeram o seguinte comentário após minhas exposições: “Cá nunca se viu isto antes…”

Então respondendo em definitivo à pergunta, se você, que está lendo este artigo, possui conhecimento, habilidades e tem atitude para atuar em gestão de empresas, consultoria empresarial e assessoria empresarial e, ainda, está disposto a começar um trabalho praticamente do zero, o “Segundo Portugal” é uma alternativa fantástica. Porém, não se esqueça de que como brasileiro em solo português, nós não temos a mesma velocidade de penetração de mercado que possuímos aqui, mas uma coisa eu afirmo e garanto por experiência e vivência própria: fora da Grande Lisboa e Grande Porto, há um “Ocean Blue” (estratégia do oceano azul, um conceito de diferenciação competitiva) com imensas novas oportunidades.

Nossos cumprimentos;
Renato Barros